Ilustração da @paulagiacobbo.art
Essa mulher do mês tem tudo a ver com o nosso Clube das Pitayas: é um símbolo da valorização da brasilidade. Ela soube ressignificar as influências externas para exaltar o que há de mais belo na cultura do nosso país. Ela foi precursora, vanguardista, modernista.
Ué, quem é essa? É Tarsila do Amaral, pintora e desenhista, uma das maiores artistas brasileiras do século XX.
Tarsila nasceu em 1886, em uma família muito rica em Capivari, no interior de São Paulo. Seu avô, conhecido como “milionário”, possuía grandes fazendas de café, que era o melhor jeito de fazer dinheiro no Brasil naquela época. Então Tarsila era da aristocracia, nascida para estudar na Europa, casar e ter filhos.
No começo, tudo fluiu de acordo com o esperado. Ainda adolescente, Tarsila foi estudar na Espanha, onde teve primeiro contato com a pintura, e logo que voltou ao Brasil casou com um médico, e tiveram uma filha. Mas Tarsila gostou das artes e queria continuar, o que era inaceitável para o marido, que queria a esposa em casa.
Tarsila não aceitou a oposição, e o casal se separou. A moça ficou “desquitada”, já que o divórcio ainda estava muito longe de ser legalizado, e a anulação do casamento deles só seria formalizada quase 20 anos depois. E não é que foi aí que a vida deu um giro e ficou interessante? Tarsila começou a estudar pintura, de verdade.
Por alguns anos teve aulas com artistas brasileiros, e no começo dos anos 1920, em meio à ebulição cultural da Belle-Époque europeia, estudou pintura em Paris. Em 1922, quando voltou ao Brasil, teve seus primeiros contatos com o movimento modernista das terras tupiniquins que queriam criar uma estética tipicamente brasileira. Nas padocas de São Paulo conheceu a trupe toda da Semana de Arte Moderna: Anita Malfatti, Mário de Andrade e Oswald de Andrade (seu futuro marido).
Foi nessa mistura de influências, de vanguardas e de movimentos artísticos que Tarsila brilhou. Ela entrou na onda modernista e inovou: foi em 1928 com o quadro que deu de presente de aniversário para Oswald, que ela inaugurou o que seria o “movimento antropofágico”. É simplesmente o quadro mais famoso desse Brasil, minha gente, o Abaporu (se não conhece pelo nome, conhece pela moça do pé grande).
O movimento todo remete ao rito canibal, afinal a ideia toda era justamente deglutir a cultura estrangeira – cubismos, surrealismo e outros “ismos” europeus – para transformar em uma cultura nossa, nova. A brasilidade ganhou novos formatos e cores, e foi um estouro, que ecoa até hoje.
Só para se ter uma ideia, em 1995, o Abaporu foi leiloado para um argentino por US$1,35 milhões, e faz parte da coleção do Museu de Arte Latino-Americana de Buenos Aires. Hoje, já não está à venda, mas há quem diga que o valor de mercado da obra chegaria a US$ 200 milhões. Atualmente os quadros da artista viajam o mundo em grandes exposições; no Museu de Arte Moderna de Nova York, ela está do lado de Picasso.
Ou seja, Tarsila acertou em cheio quando apostou nas cores e formas desse Brasilzão! Claro que além das obras mais conhecidas da artista, há também aquelas em que ela expôs fortes críticas sociais, tema inescapável no nosso país. Muitas das suas pinturas revelaram a periferia brasileira da época, a exaustão dos trabalhadores, as péssimas condições dos migrantes nordestinos.
Tarsila é um ícone nacional pela inovação artística, pela valorização e pelo retrato do nosso país através das nossas próprias lentes. Mulher, nascida no final do século XIX, desquitada, recasada, reseparada (e depois ainda engatada com um homem 21 ano mais novo), ela foi a pintora da obra mais prestigiada da história do nosso país.
Tarsila faleceu aos 86 anos, nos anos 1970, nos deixou mais de 270 obras e muito orgulho de ter uma artista dessas nos representando mundo afora.